COLABORE

“Teto, terra, trabalho” foram os temas centrais discutidos no encontro da 6ª Semana SocialBrasileira

Institucional

Mais de 60 pessoas participaram representando diversos movimentos sociais entre Bahia e Sergipe

Publicação: 29/10/2023



Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

A Semana Social Brasileira (SSB) envolve a vivência da fé, na realidade da vida, na promoção da dignidade de todas pessoas, na ação política para a transformação social, na vivência do Sagrado, e na defesa dos direitos humanos fundamentais e da natureza. Nessa perspectiva, foi realizada em Feira de Santana (BA), entre os dias 27 e 29 de outubro, a 6ª Semana Social Brasileira. Participaram mais de 60 pessoas, entre representantes e lideranças de comunidades, movimentos sociais, agentes de pastorais sociais, clero, leigos e leigas, que discutiram sobre os temas “Terra, Teto e Trabalho”, tema desta edição da SSB.

Com saudação inicial de Dom Zanoni Castro, Arcebispo da Arquidiocese de Feira de Santana e Referencial da 6ª Semana Social Brasileira do Nordeste III, ao longo dos 3 dias de evento foram feitos diversos painéis onde os convidados puderam expor e provocar o grupo com diferentes ideias sobre “Terra, Território e Água” (Painel I), “Trabalho” (Painel II) e “Teto” (Painel III). Em seguida dos painéis, os participantes puderam fazer rodas de conversa para debater os pontos mais importantes trazidos e assim encaminhar as prioridades de ação e possíveis soluções para os diferentes temas. Além disso, na sexta (27/10), escutamos Padre Dário Bossi, Assessor da Comissão para a Ação Sociotransformadora da CNBB Nacional, que rememorou a história e os temas tratados nas SSBs ao longo dos 20 anos que o movimento vem acontecendo na perspectiva de ser um serviço evangelizador para atuação sociopolítica na Igreja. 


Padre Dário Bossi e Bispo Dom Zanoni na noite de abertura do evento, sexta-feira, 27 de outubro. Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

No Painel I (“Terra, Território e Água”), tivemos falas de Dom Vicente Ferreira, Bispo de Livramento de Nossa Senhora e Membro da Comissão de Ecologia Integral e Mineração da CNBB, Anselmo de Souza, agente da CPT de Juazeiro (BA) e membro da Articulação de Fundo e Fecho de Pasto e Claudeane Bispo, liderança Quilombola do Território Brejao dos Negros (SE). No Painel II (“Trabalho”) ouvimos Adriana Lima, Diretora de Formação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Feira de Santana, Lana Breicher, Professora da UFBA, e Daniel Bittencourt, articulador da Rede Bem Viver e da “Comunidade que Sustenta a Agricultura” em Vitória da Conquista (BA).  No Painel III (“Teto”) foi a vez de escutarmos Marcos Correia Carvalho da Pastoral do Povo da Rua de Aracaju (SE), Renildo Silva do Movimento Nacional de População de Rua, e Maura Cristina da Silva da Articulação dos Movimentos e Comunidades do Centro Antigo de Salvador e representante do Despejo Zero da Bahia. Abaixo há um detalhamento sobre o conteúdo das falas de cada Painel. 

O Bispo Dom Zanoni, afirma que este foi um momento forte de encontro, de reflexão, de participação, com protagonismo das mulheres e das lideranças das nossas comunidades e dos movimentos sociais. Para Maria José Pacheco do Conselho Pastoral dos Pescadores/as (CPP) o Momento Regional da 6ª Semana Social veio para renovar: “O encontro foi de imensa importância porque veio reanimar, reacender nossas chamas na luta pela vida, na luta pelo território, pelo direito à cidade. Vamos continuar contribuindo e construindo este nosso Projeto popular para o Brasil”, afirma Pacheco. 

Jardel Nascimento, Secretário Regional da Cáritas NE3, lembra que fomos convocados pelo Papa Francisco a ter cuidado com a nossa Casa Comum. Assim a Cáritas NE3, junto com os movimentos sociais, pastorais sociais e entidades parceiras, assumem o protagonismo nesta missão, que é a missão da Igreja. “Neste encontro pudemos pautar, refletir e alicerçar esta luta na garantia de direitos para que todos e todas que ainda vivem em situação de vulnerabilidade social possam ter seus direitos garantidos.”, completa Nascimento. 


Fala de Dom Vicente Ferreira na SSB - Momento Regional.  Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

Dom Vicente, já na perspectiva das resoluções, acredita que poderemos enfrentar os desafios abordados nestes dias a partir de uma conversão ecológica e fortalecendo, cada vez mais, o trabalho das pastorais e movimentos sociais. “A natureza não é separada de nós como objeto que pode ser explorado de qualquer jeito. Somos natureza e sabemos que nela tudo está interligado. Por isso, defender os direitos humanos deve ser acompanhado pela defesa da biodiversidade. É nesse sentido que apoiamos a 6a Semana Social Brasileira como seu grito profético em prol dos direitos básicos de todos. Sem terra, teto e trabalho muitas pessoas e grupos sofrem. O caminho então é reforçar as redes de nossas pastorais socioambientais e dos movimentos sociais. Sem participação popular esse sistema neoliberal que está acabando com a água, dominando os territórios etc, será cada vez mais forte”, declara Ferreira. 


DESCRITIVO DE CONTEÚDO DOS PAINÉIS

PAINEL  I, “Terra, Território e Água” (Sábado, 28/10):


Painel I  - Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

Dom Vicente Ferreira: A humanidade enfrenta uma grave crise socioambiental e estamos num caminho de sistema de morte. Os gritos dos pobres e da mãe terra e dos pobres ecoam por toda parte. Não podemos negar os dramáticos efeitos do aquecimento global, da falta de água, da poluição do ar e de tantas outras feridas. 

Diz que sabemos que tudo isso é causado pelo sistema capitalista que coloca o lucro acima da vida. A injustiça socioambiental depõe contra o domínio do planeta exercido por um 1% da população mundial. Ou seja, 99% da população sofre para que este 1% desfrute de conforto.

Também falou sobre a importância de estarmos presentes e ativos nos territórios. “As narrativas da Cáritas devem ser escritas mais com os pés do que com as mãos", afirma. 

Anselmo Ferreira de Souza: Fala sobre a necessidade de entendermos que as comunidades tradicionais vivem de uma maneira que está em consonância e respeito com a terra; que a terra é sagrada e é garantia de toda a vida. Denuncia que a os modos de vida destes povos tradicionais estão sendo devastados por diversas questões em seu território e ameaçando os modos de vida de comunidades de fecho de pasto, por exemplo, com ameaças que vão desde o uso de agrotóxico na terra à implantação da mineração na região.

Claudiane Bispo: Em uma fala muito musical, cheia de poder feminino, emocionou os que a escutaram. Falou sobre o Protocolo de Consulta que foi recentemente construído pelo seu território e a importância deste importante instrumento jurídico para as comunidades tradicionais, mas também sobre o fato de que talvez este instrumento, por si só, não seja o suficiente para garantir a segurança do seu território. 

“A perseguição não acaba quando tem a conquista da terra”, afirma, enfatizando que o território ainda é ameaçado por fazendeiros da região, que agridem o solo com uso de agrotóxico e desmatam, e também pelos avanços da carnicicultura (criação de camarão em cativeiros), prática que desmata, principalmente, os manguezais. 


PAINEL  II, “Trabalho” (Sábado, 28/10):


Painel III - Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

Adriana Lima: Trouxe alguns pontos sobre produção de alimentos e os produtores. “Nós produzimos o alimento, alimentamos a população e o estado não nos reconhece nem nos enxerga”. Aponta que questões como a desigualdade e a exclusão social afeta fortemente a autoestima das pessoas. Afirma que é necessário travar uma luta árdua na questão fundiária e que a inovação precisa chegar para a agricultura familiar. 

Lana Breicher: apresentou algumas questões de trabalho sobre a inteligência artificial no sentido de que “as pessoas se transformam em máquinas e as máquinas querem ser pessoas”. Entre outros pontos do trabalho, trouxe dados de uma pesquisa que fala que os trabalhadores formais que não puderam ficar em casa durante a pandemia foram os que mais tiveram taxa de mortalidade na pandemia, como os frentistas, motoristas de ônibus e atendentes de supermercado. (leia aqui)

Daniel Bittencourt: Falou sobre a importância e a possibilidade de produzirmos e consumirmos localmente, questionando “por quê ainda não conseguimos consumir algo de forma justa, que é feito perto de nosso território?”, e apresentou uma nova possibilidade: a ideia do “Comunidade que Sustenta a Agricultura”. É um outro modo de consumir, e de acordo com o site do projeto: “nos apresenta uma prática de sucesso para um desenvolvimento agrário sustentável e o escoamento de cultivares orgânicos de uma forma direta ao consumidor, criando uma relação próxima entre quem cultiva e quem se alimenta.” (fonte)


PAINEL  III, “Teto” (Domingo, 29/10):


Painel III - Foto: Aline Gallo - Cáritas NE3

Maura Cristina da Silva: Morar é um direito. Aponta que devemos abolir a palavra “invasão” do nosso dicionário, visto que moradia é um direito que é negado. Precisamos entender as violações de direito, percebendo que há um histórico muito grande, já que o povo preto chegou aqui há muito tempo e trabalhou muito para este país. “Desde a escravização, não tivemos terra, teto nem trabalho. Tenho muito orgulho de ser mulher preta porque conquistamos tudo com muita luta: ser preto é não receber herança, tudo foi conquistado por nós mesmos!”, afirma. 

Fala sobre o processo que está acontecendo em Salvador que chama de “gentrificação”, que é, basicamente, tirar os pretos pobres e substituir “por outro tipo de gente”. Conta que sua principal motivação para seguir na luta foi a questão racial e nos deixa como recado um provérbio africano para inspiração: "Se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá acompanhado.”

Marcos Correia Carvalho: Conta sobre o trabalho que tem feito na sua região, e diz que não resolvem a situação da pessoa, mas ameniza o sofrimento. Defende que infelizmente ainda há muitos preconceitos e discriminações com as pessoas em situação de rua e enfatiza que ninguém está na rua porque quer. “Devemos vê-los como HUMANOS, sobretudo”, complementa, enfatizando que, até mesmo por experiência de vida própria, a moradia e o teto ajudam a retomar a dignidades destas pessoas. 

Renildo Silva: Falou sobre o surgimento do Movimento Nacional de População de Rua; contou que teve muita história de sangue derramado neste processo, e que a própria bandeira vermelha do Movimento representa isso. Explica que é um Movimento apartidário, querem ser independentes, mas reconhecem todos os parceiros de rua que se unem à sua luta, como a Pastoral de Rua. “Quem vai contar a nossa história, somos nós”, finaliza. 


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A Semana Social Brasileira é uma iniciativa da CNBB, coordenada pelas pastorais sociais e movimentos populares do Brasil. Saiba mais no site: https://ssb.org.br/ .

Entre os dias 27 e 29 de outubro de 2023, estiveram presentes na 6ª Semana Social Brasileira (Momento Regional) representantes dos seguintes Movimentos, Pastorais Sociais, Articulações, entidades parceiras: Movimento de Organização Comunitária, Movimento dos Pescadores e Pescadoras, Articulação de Fundo e Fecho de Pastos, Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA, Movimento Camponês Popular  - MCP, Movimento Quilombola, Movimento da População em Situação de  Rua, Movimento Cultural Águas Claras, Coletivo Grito dos Excluídxs de Salvador, Articulação dos Movimentos e Comunidades do Centro Antigo de Salvador, Movimento Igrejas em Saída, Pastoral do Povo da Rua de Aracaju, Pastoral Afro Arquidiocesana de Salvador, Pastoral Afrobrasileira, Pastoral Arquidiocesana da Aids de Salvador, Pastoral da Arquidiocesana do Migrante e Refugiado de Salvador, Pastoral da Criança, Pastoral Operária , Pastoral Carcerária, Comissão Pastoral da Terra (CPT BA - Diocese de Bonfim e Diocese de Juazeiro), Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), Comunidades Eclesiais de Base (CEBS), Rede Jubileu Sul, Instituto da Mulher Negra Odara, Sintraf Campo Formoso e FSA, Comunidade Kolping São Francisco de Assis, Lar Santa Maria Itiúba (BA), Casa Serena de Salgado - Sergipe, CNBB Regional NE3, Cáritas Brasileira Regional Nordeste 3, Cáritas Diocesana de Propriá, Cáritas Diocesana de Estância, Cáritas arquidiocesana de Feira de Santana, Cáritas diocesana de Caetité, Diocese  de Amargosa, Diocese do Senhor do Bonfim, Diocese de Juazeiro, Diocese de Livramento de Nossa Senhora.


Texto, fotos e vídeos da cobertura: Aline Gallo, Comunicadora Popular da Cáritas Brasileira Regional NE3


Contribuição de texto nos relatos: Gilmara Silva, equipe de assessoria da Cáritas NE3


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