COLABORE

Seminário reúne representantes de movimentos sociais e comunidades tradicionais

Áreas de Atuação

Seminário Crise Climática e Alternativas Socioambientais discutiu adaptações para as mudanças climáticas

Publicação: 21/04/2023


Tudo está conectado, e como uma família de nações devemos ter uma preocupação comum, fazer com que o meio ambiente seja mais limpo, mais puro e preservado. E cuidar da natureza, a fim de que ela cuide de nós.

Papa Francisco, Laudato Si


As alterações climáticas têm impactos globais, mas também regionais e locais. Foi neste sentido que o “Seminário crise climática e alternativas socioambientais” reuniu nos dias 14 e 15 de abril em Salvador representantes da Cáritas NE3, CIMI, CPT, CPP, MOC, e integrantes de comunidades tradicionais de diversas regiões de Bahia e Sergipe.  Temas importantíssimos como direitos da natureza, racismo ambiental, tecnologias socioambientais, mudança climática e seus impactos sobre as comunidades tradicionais foram debatidos ao longo do encontro que foi orientado pela Encíclica Laudato Si: sobre o cuidado da Casa Comum, do Papa Francisco. 




A Cáritas NE3 nos seus 35 anos de atuação sempre teve a preocupação de trabalhar projetos e ações ligadas às questões socioambientais, atuando com ações e projetos de convivência com o bioma semiárido. Para Geri Lima, assessor da Cáritas NE3 e membro da coordenação da Cáritas NE3, foi um importante momento de reencontro pós pandemia: “Estamos de volta presencialmente para ouvir as entidades e comunidades e pensar estratégias coletivas comuns e plausíveis, fazendo um movimento de não permitir que se continue de forma tão danosa essa destruição ambiental e da vida das pessoas, sobretudo das comunidades tradicionais - as mais impactadas”. 


Como a Terra é um sistema onde tudo está conectado, mudanças de temperatura em uma área podem influenciar mudanças em todas as outras. Assim, as consequências das mudanças climáticas incluem secas intensas, escassez de água, incêndios severos, aumento do nível do mar, inundações, derretimento do gelo polar, tempestades catastróficas e declínio da biodiversidade. [...] (ONU, 2022). Alguns outros impactos locais da mudança climática e dos grandes negócios do capital nas comunidades foram observados como redução da produção de alimentos, perda de espécies, redução da vegetação destinada ao extrativismo, poluição das águas, rebaixamento dos rios que ocasiona redução da disponibilidade hídrica e até mesmo uma possível morte do Rio São Francisco com sua salinização e pouca vazão de água. Com isso as comunidades que não precisavam comprar alimentos como arroz, milho, etc., porque produziam o ano inteiro, agora estão precisando comprá-los na cidade. Somados a isso ainda foram relatados uma série de direitos humanos que são violados diariamente. 


Maria José, uma das lideranças do território Quilombola de Brejão dos Negros (SE) diz que antigamente a lagoa que também ajudava a irrigar a produção agroecologica do arroz foi escavada para fazer os viveiros de camarão. “E não são nem pessoas que são da comunidade, são pessoas de fora, de outros estados que chegaram e nos tiraram o acesso a nossa terra. Até para gente ir pros braços e pernas de maré para pescar para tirar o nosso sustento (porque sempre vivemos disso), não podemos passar. E para ir para as marés temos que passar por estes viveiros! Então mudou muita coisa, … para pior”, nos conta. Maria e outros moradores da região ainda comentam que depois da construção de certas barragens a vazão do Rio São Francisco diminuiu muito, o que pode também ter permitido o processo de salinização deste Rio que consequentemente está extinguindo diversas espécies de peixe de água doce que antes eram o sustento destas comunidades como o mandinha, sururu, tubarana, sarapó, entre outros. 




Já Marizelha Lopes, representante do Movimento dos Pescadores e moradora da Ilha de Maré, alerta que com o aquecimento global as ilhas, como estas da Baía de todos os Santos, serão os primeiros territórios a serem afetados. Além disso, comenta que “Não existe democracia! Para nós, povos e comunidades tradicionais, seja direita ou esquerda, nós estamos no meio levando as porradas”, denunciando também racismo da raça, racismo institucional e racismo ambiental que sofrem continuamente. 


A convidada Zezé Machado da CPP (Comissão Pastoral dos Pescadores) explanou sobre o termo “Racismo ambiental” que se expressa pela forma sistemática como comunidades tradicionais são especialmente atingidas pela lógica da exploração econômica sobre seus territórios. Assim as consequências ambientais não são distribuídas de maneira homogênea: “São determinados grupos negros e indígenas que são atingidos de maneira particular, tornando-os mais vulneráveis”, comenta. Estes mesmos grupos são os que são excluídos pelos processos de definição de políticas públicas ambientais, o que caracteriza também uma outra forma de racismo ambiental.


Falas


Flavio Lopes, do CIMI, avalia que o Seminário foi muito importante no ponto de vista das comunidades tradicionais “que há muito tempo estão sendo ilhados pelos grandes negócios, não são ouvidos. Com esta pandemia, fortaleceu ainda mais este isolamento. Então esse povo vem pra cá e começa a se dar conta que podem ser ouvidos.” E justo esta foi uma das questões levantadas para contornar esta crise: escutar o que estas comunidades tradicionais têm a dizer, já que são elas quem preservaram até hoje, de maneira respeitosa, grande parte do que ainda resta de natureza. Ruben Siqueira (CPT), neste caminho, complementa: “A ciência está voltada para o negócio da crise climática que acha que sequestro de carbono, venda do direito de poluir e o negócio da água, energia solar, eólica, estão para venda. Quem foge dessa lógica do mercado , essa lógica capitalista, destrutiva, causadora desta crise que está aí são os povos tradicionais.” 


Mais do que nunca é central intensificar o debate em torno das questões ligadas à crise climática e como as comunidades tradicionais e as mais pobres são as mais atingidas por estas mudanças. Com este Seminário entendemos que dialogar, escutar, aprender com as comunidades tradicionais deveriam fazer parte de uma das soluções da crise climática. É urgente construir e fortalecer narrativas que possam dialogar com a sociedade e o Estado na superação do atual modelo de produção - sendo este um desafio humanitário que temos enfrentado e que continuaremos a enfrentar décadas à frente.




Momento de mística com nossos irmãos Apurinã Kiriri e Divalcir Xakriabá. Eles também falaram ao longo do encontro sobre desafios e realidades dos seus territórios no Oeste da Bahia. As mudanças climáticas também vêm afetando seus estilos de vida. 




No evento também foi lançada a cartilha "Boas práticas para adaptação e enfrentamento às mudanças climáticas" disponível para download gratuitamente no nosso site neste link. Assim, esta cartilha é um instrumento de disseminação de práticas e inspirações de formas de adaptação às mudanças climáticas por meio de algumas tecnologias sociais já implementadas. Compartilhem com seus companheirxs!





Este evento foi realizado com apoio da Cáritas Alemã, Cooperação do Governo Alemão e Misereor. 

Texto por Aline Gallo

Comunicadora Cáritas NE3















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